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Aquilo que nos une



Por Larissa Mattos, há 5 anos; para mim.

Não sei dizer de onde surgiu vício de rotular emoções em verbetes e jogá-los sobre uma folha de papel. Arriscando um momento de tristeza, de incompreensão ou de loucura, muito provavelmente eu não estaria errada. Mas não é para discutir o 'como' que estou aqui, às onze da noite, te escrevendo. É para discutir os porquê's. E, sendo assim, ouso afirmar: a escrita não surgiu em nossas vidas por acaso.  

Escrever, mais que uma forma de terapia ou um hobbie, é um dom. Conheci pessoas que sofriam horas diante da caneta e do papel, sem conseguir exprimir meio parágrafo sequer. Pessoas cujo talento para expressão talvez estivesse na oratória, no desenho, no cinema, ou em qualquer outra forma de arte, mas certamente não na escrita. E não porque não escrevessem adequadamente - de maneira nenhuma! Qualquer um pode muito bem deitar numa folha as palavras que não ousa dizer em voz alta. Refiro-me, contudo, à forma como o fazem que, quando temos acesso à textos como os teus, soam artificiais, comedidas, antinaturais.

Conheci poucas pessoas com uma capacidade de verborragia como a sua - e, o mais importante, acompanhada de clareza e pluralidade singulares, impressionantes. E minha vida não poderia ter se entrelaçado à sua de outra maneira senão pelo que temos em comum: um mundo de palavras. Li sobre sua felicidade em termos tão leves quanto pluma; li sobre sua dor, tão intensa e destrutiva, como se o sangue escorresse do papel; li sobre teus amores com o coração batendo em urgência; li sobre você e acabei lendo (e aprendendo) muito sobre mim também. Porque você tem essa capacidade: a de transmitir tudo que se passa dentro de você de uma forma direta, incisiva e verdadeira - e, por isso mesmo, tão maravilhosa. E sei que peco tentando descrever o efeito que suas palavras têm sobre mim, mas sei que há de me perdoar. O ser humano tem dessas ambições infundadas - tentar descrever o belo é uma delas. 

Por fim, diante disso, o que me resta é repetir: por favor, não pare nunca. Continue tendo força para para contar tua história em forma de prosa, para levar tuas palavras mais e mais longe. Agora você sabe, elas não são só tua sina e tua salvação. Deixaram até de ser você mesma, em última instância, para se tornarem também pedacinhos de outras pessoas. Você derramou sobre nós o que de mais íntimo e intimidador havia em ti e nos encantou. Identificação é o termo. E, sem dúvida, esse é o melhor presente que você recebeu nessa vida. Não o desperdice nunca.

Sou extremamente grata por tê-la conhecido, e, sobretudo, por ter feito parte do seu processo de descoberta da escrita. Com muito carinho, de quem muito te admira,

Larissa.

"A escrita o envolvia no seu âmago, num abraço quente e reconfortante, evocando a desejada união. Continuaria a exprimir através das palavras aquilo que lhe vai na alma, a sua inquietação. E estas iriam afirmar o seu devaneio, a sua dúvida, a sua realização. O seu desejo permanecerá descrito nas linhas que unem o presente ao futuro, refletido na sua intemporal ambição."

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