Não que fosse fácil continuar adotando aquele status, mas confesso que a zona de conforto onde me encontrava mantinha a cicatriz dentro do peito intacta e isso, por aquele momento, bastava.
Sempre tive uma mania de ter medo da vida, medo do passo seguinte. Se bem que, nem sempre na verdade. Não me lembro exatamente como começou ou de onde ele, o medo, veio. Mas no fim instalou-se da mesma forma. Eu chamo de mania porque, embora eu não goste de admitir, eu meio que escolhi olhar de longe. Decidi ser a leitora ao invés da personagem da historia. Afinal, e você deve concordar comigo, é ridiculamente mais fácil apenas fechar o livro quando a fabula começa a incomodar e sucumbir.
Quem me escuta falar imagina o quão devastador foi ou deve ter sido viver as coisas que vivi. E embora no começo poucas pessoas colocassem fé nos meus traumas eu sempre os fiz ser muito reais. Fazia questão de gritar bem alto os nomes dos demônios que me assombravam como uma maneira de valida-los. Essa é outra das minhas manias...eu gosto de tudo que não existe. E gosto dos impossíveis também. As vezes reflito um pouco sobre esse lado meio sadomasoquista que vive em mim, mas nunca encontro as respostas que preciso, então quase sempre ignoro.
Apesar de tudo isso e apesar da melancolia que resseca o meu peito eu sou uma pessoa feliz, comunicativa, aparentemente impenetrável e ate forte em alguns momentos. Mas vou contar uma coisa: eu na verdade sou puro fragmento. As coisas que sinto e que vivo são sempre desesperadoramente incompletas, inacabadas. Por mais que em muitos momentos eu me faça acreditar que é suficiente...no fundo eu sei que o pote esta sempre meio vazio. Talvez porque a unica coisa que me permiti viver plenamente foi a dor. Ela sim, preencheu todas as lacunas do meu ser até que eu me transformasse nela e deixasse de me auto-conhecer.
Essa coisa de fragmentos é bastante subjetiva e difícil de explicar, mas posso dar exemplos. Não posso dizer que vivi o bastante para ter muito o que contar. Aliás, aos olhos de muitos, eu não vivi nada ainda. E dessa mesma forma, eu também não tive muitos amores, nem muitas felicidades. Eu trato as novidades que sinto como coisas especiais. Como cristais brilhantes e preciosos. Sempre fui assim. O mínimo de tudo se torna gigante quando toco. Por isso falo dos fragmentos. Porque só quando finalmente me consome por completo é que me dou conta do quão raso, pouco, incompleto aquilo foi. E o mais inquietante de tudo, são os buracos. Sim, porque abro um espaço tão exageradamente grande dentro do meu coração, achando que quase não caberia no peito que, quando finalmente chega ao fim, o que sobra é aquela terra seca, infértil onde insisto em fazer brotar uma flor.
Não existem muitos desses buracos em mim. Na verdade um ou dois. Um amor acabado e uma amizade partida. Mas são suficientes para tomar quase todo o terreno. E tudo isso só para explicar o porquê eu tenho medo, porquê não me permito, porquê eu sempre mantenho o meu muro de defesa a postos. Tem pouquíssimo espaço lá. Se eu errar novamente irei sucumbir em meu próprio abismo.
Sucumbir pela mania de fragmentar meus sentimentos.
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